Páginas

Projetos sem sentido

Cuidado com eles.

Hoje vou utilizar o prelúdio de um dos meus livros preferidos (A Dança – Oriah Montain Dreamer) para compartilhar alguns aprendizados na experiência como Coach.

E se, na verdade, não importa o que você faz e sim como você faz, seja lá o que for?
Como isso mudaria o que você decidiu fazer com a sua vida?”

Há uma proliferação do uso das técnicas de coaching no mundo corporativo nas últimas décadas. Várias metodologias, cursos de todos os tipos e público para todos os serviços. A ideia nesse post não é tratar da qualidade do coaching, não tenho essa pretensão, mas sim do sentido com que se busca esse serviço. Tanto para o cliente (coachee), quanto para o profissional que o oferta (coach).

É comum haver uma confusão a respeito da função do coaching, como um processo de cura ou de orientação. Esses aspectos cabem ao campo da terapia ou da consultoria. Coaching tem a ver com apoio ao desenvolvimento, ou seja, o processo apoia, mas cabe apenas ao cliente tomar as decisões e seguir o seu caminho.

Pensando nisso, comecei a observar que há muitas discussões a respeito das expectativas miraculosas dos clientes em relação aos processos de coaching, mas pouco se fala das expectativas dos profissionais que ofertam o coaching sobre seus clientes.

“E se você pudesse ser mais presente e ter uma atitude mais acolhedora com cada pessoa que encontrasse, se, em vez de estar fazendo um trabalho que achasse importante, estivesse trabalhando como caixa de uma pequena loja ou recepcionista de um estacionamento?
Como isso mudaria o modo como você quer passar seu precioso tempo neste planeta?
E caso sua contribuição para o mundo e a conquista da sua felicidade não dependam da descoberta de um novo método de rezar ou de uma técnica de meditação mais adequada, nem de ler o livro certo ou comparecer ao seminário apropriado, e sim de você realmente ver e apreciar profundamente a si mesmo e ao mundo como eles são neste momento?
Como isso afetaria sua busca de crescimento espiritual?”

Ter coragem de ser menos importante que o processo do cliente pode ser um desafio. Vejamos, é comum que o coachee venha para o processo de coaching com uma enorme expectativa de que, com um plano bem estruturado todos os seus problemas serão resolvidos. É claro que ele sabe que isso não é verdade, como todos nós sabemos que atividade física durante um mês não vai deixar ninguém malhado, mas ainda assim pode haver aquele desejo íntimo de que funcione e rápido. Ainda que as expectativas estejam alinhadas, elas existem, de ambos lados. E acredito que a mais desafiante de administrar seja a do Coach, visto que nem sempre é considerada.

“E se não houver necessidade de mudar, de se transformar numa pessoa mais bondosa, mais presente, mais amorosa ou mais sábia?
Como isso afetaria todos os aspectos da sua vida em que você está sempre procurando ser melhor?
E se a tarefa for simplesmente desabrochar, se tornar quem você realmente é — uma pessoa meiga, bondosa, capaz de viver plenamente e de estar apaixonadamente presente?
Como isso afetaria a maneira como você se sente quando acorda de manhã?
E se quem você é essencialmente agora for exatamente o que você será sempre?
Como isso afetaria o modo como você se sente em relação ao futuro? E se a essência de quem você é e sempre foi for suficiente?
Como isso afetaria a forma como você vê e se sente em relação ao passado?”

E se o seu cliente não conseguir alcançar todas as metas?  E se não for possível que ele trace um plano aprofundado? E se alcançar uma nova visão a respeito das questões que o impedem de decidir, for o máximo possível no processo de desenvolvimento dele naquele momento? Você consegue lidar com isso?

Coaching não resolve questões emocionais, mas se conteúdo racional fosse o suficiente para resolver tudo, mentalizar seria mais eficiente que pegar peso para ganhar músculos. É preciso sensibilidade para compreender que qualquer passo só pode ser dado com segurança quando faz sentido à mente e ao coração de cada pessoa e, quando falo de coração, quero dizer que as emoções também fazem parte do processo de coaching, ainda que o foco não seja tratá-las terapeuticamente. O importante é que elas possam fazer parte genuinamente.

Quando experimentei o processo de coaching pela primeira vez, o foco da profissional que me atendia era fazer com que eu alcançasse o objetivo com eficiência. Sentia que a pessoa estava mais centrada em si e no objetivo que ela tinha enquanto profissional do que no meu processo, ou naquilo que fazia sentido (e era possível) para mim. Provavelmente não foi intencional ou consciente essa postura, mas me fez sentir mais pressionada que apoiada. Ali decidi que o respeito seria o meu guia como profissional dessa área. Outro aspecto que observei foi o quanto a paisagem emocional interfere nessas percepções.

Como manter o foco nos objetivos se há processos emocionais em evidência? Olha, sejamos sinceros, você conhece alguém que não tenha nenhuma emoção conturbada lá em algum lugar do seu interior? Eu ainda não tive a chance de conhecer esse ser. O que isso significa? Que não tem ninguém pronto, estamos nos fazendo a cada dia e, portanto, teremos sempre as nossas questões. O cuidado necessário é com a função do coaching na vida do cliente. Cada um tem um tempo de amadurecimento e pode ser que o seu cliente precise apenas de um plano para o primeiro passo. Nem todos estão preparados para grandes planos. E tudo bem.

Nesse caminho do primeiro passo, pode-se chegar à conclusão de que seja necessário um tratamento terapêutico. Tive uma experiência assim, uma cliente que indiquei para a terapia me disse que precisava do coaching como apoio para ter coragem de ir para a terapia. Cinco meses depois, três deles em terapia, toda a vida da cliente foi mudada por suas novas escolhas.

Vida de Executiva


Uma outra cliente me disse um dia desses que se questionava sobre o seu preparo para o processo de coaching, pois, ao final, muitas das questões que existiam antes do processo ainda não haviam sido totalmente resolvidas. Para uma pessoa absolutamente racional - ainda que sensível - planos concretos são o parâmetro válido para a eficácia do processo. E o são, na maioria dos casos, mas não em todos. Quando se trata de uma mudança completa de vida, um processo certamente não será o suficiente para colocar tudo em ordem. Quando a confusão é maior que a percepção da força interior, ir para a ação pode ser mais arriscado do que aprender a lidar com o caos. Qual era o sentido de ter um plano concreto em dez sessões nesse caso? Agir ou continuar a planejar ações que não faziam sentido real, mas que geravam a segurança de permanecer sem movimento?

Quando se trata de pré-requisitos para o processo de coaching, acredito que apenas dois são de fato relevantes: a capacidade de assumir a responsabilidade por seu processo e a capacidade de encontrar sentido no processo. Quando descobrimos o sentido para a decisão, encontramos a função dela em nossas vidas e portanto, o passo seguinte.

Ao final da nossa conversa, ela disse ainda que o principal ganho do processo havia sido o olhar mais leve sobre o que precisava ser decidido, que no caso dela, envolvia uma mudança completa de vida. Duas semanas depois, ela me envia um e-mail, absurdamente honesto e cheio de significado, me contando que havia decidido o que fazer. Aquilo que atendia de fato às suas competências, ao seu potencial, ao seu momento de vida e especialmente, ao seu coração. Agora sim, é possível colocar em prática as várias ações determinadas em coaching e muitas outras.

Com ela aprendi a gerenciar melhor minhas expectativas sobre o tempo que leva para que cada um escolha se movimentar. Não bastava que eu visse todo o potencial de prosperidade, não bastavam as técnicas ou o meu apoio como coach, era preciso que ela tomasse o seu tempo para então, se encontrar com a força de uma decisão.

E para ela deixo as perguntas finais de Oriah Montain Dreamer:

“E se o fato de nos tornarmos quem realmente somos não acontecer através do esforço e da tentativa, e sim por reconhecermos e aceitarmos as pessoas, os lugares e as experiências que nos oferecem o calor do estímulo de que precisamos para desabrochar?
Como isso determinaria as escolhas que você faz a respeito de como quer viver o momento presente?
E se você soubesse que o impulso para agir de uma maneira que irá criar a beleza no mundo surgirá bem no seu íntimo e servirá de orientação sempre que você simplesmente prestar atenção e esperar?
Como isso daria forma à sua quietude, seu movimento, sua disposição de seguir este impulso, de apenas se soltar e dançar”?


** Querida coachee, esse prelúdio é para você. Desejo que seus projetos concretos sejam repletos de sentido em cada presente e em cada caos que você viver, a partir daqui. 

Plano de (motiv)Ação

Demorei, mas voltei.

E foi por uma boa causa. Nos últimos meses tenho refletido bastante sobre os rumos na carreira e na vida e, portanto, precisava viver algumas experiências para amadurecer as ideias, acalmar o coração e ter boas coisas para contar aqui.

Eis que recebo um recadinho pelo Facebook: "Tia Tati, dá uma atualizada no seu blog... Saudades dos seus textos :)". Meus alunos me chamam de tia as vezes, uma tia jovem, quero deixar claro. E esse foi um belo estímulo (e/ou puxão de orelha, como queira) para voltar a escrever.

Aproveitando o ensejo, vou falar sobre ele: o estímulo. O que isso tem a ver com o título da postagem? Não há plano de ação que vá para a frente sem ele minha amiga.

Os últimos projetos desenvolvidos aqui na empresa têm me ensinado algo importante sobre o nível de motivação e engajamento das pessoas para agir. Cada qual utiliza um estímulo diferente para se manter em movimento: o reconhecimento, o aumento na renda, a vontade de ver o projeto dar certo, trabalhar menos e ganhar mais, crescer, e por aí vai. Ou para se manter parado: o salário é baixo, o clima é ruim, estou cansada, não me interesso pelo que faço, e por aí vai também.

Mas tudo começa (ou para) com o estímulo. E gastamos um tempo enoooooooorme procurando resolver os problemas já instalados, sem as vezes pensar no que os causou, ou o que os estimulou para que se manifestassem. 

E então o ciclo de instala: estímulo, reação, resultado (que é um novo estímulo). Ok, até aqui nada de novo. Mas eis que surge o comentário da aluna, que me faz lembrar de um acontecimento e "plim", cá estou a escrever. 

Há algum tempo entregamos um projeto para um cliente e boa parte dele já estava implantado. Na reunião final, surge o seguinte diálogo com um dos sócios:


Cliente: Então, agora que acabou o processo você vai de quanto em quanto tempo lá na empresa cobrar da gente as coisas que faltam fazer? Você vai cobrar a gente né?
Eu: Não, não vou cobrar vocês.
Cliente: É, mas se você não cobrar, pode ser que não façamos tudo e se o trabalho não der certo, eu posso falar mal da sua empresa no mercado.
(...).

Esses diálogos são mais comuns do que imaginamos. Podem ser transparentes como com esse cliente, ou podem ser velados. Mas o importante é perceber como há aí uma busca de estímulo através da transferência de responsabilidade. Existe uma expectativa sobre o consultor e sobre o coach de que esses profissionais terão todas as respostas e que, depois de contratá-los, tudo vai se resolver. A má notícia é que não vai. Só quem tem poder para resolver um problema é o dono dele. Os demais são assessores, contribuem, mas não resolvem.

O que o meu cliente queria dizer é: Não estou estimulado o suficiente para agir. Havia a consciência da necessidade, um projeto estruturado com a participação dele, investimento financeiro envolvido e ainda assim sem estímulo suficiente para agir.

Para esse cliente em especial, conduzi uma sessão de coaching e depois de tomar consciência do que o impedia de agir, foi mais fácil se desapegar da necessidade de ser cobrado pela consultoria.

Tenho pensado que para projetar decisões organizacionais é preciso projetar também decisões estimulantes. Explico. Projetar decisões estimulantes tem a ver com sentir antes de se envolver em algum projeto, se haverá estimulo para agir. É preciso responder a uma pergunta com toda a honestidade: o que me move nesse trabalho? (Sem metáfora hein gente?! Literalmente movimento, levantar a bunda da cadeira e mandar ver).

O resultado é proporcional à entrega. Ninguém se entrega sem movimento, por menor que ele seja. Então, antes de começar qualquer coisa, faça o seu plano de motivação e compreenda se durante o processo você vai de fato suportar os desafios da conquista sem paralisar. E caso, dê muita vontade de parar, assista esse vídeo aqui, pode ser estimulante.